Nos dias atuais, é cada vez mais comum ver grande parte da população com um celular na mão. Seja em pontos de ônibus, academias, shoppings ou nas ruas, esse convívio constante com a tecnologia pode trazer consequências psicológicas, como a dependência no celular, e algumas que afetem o convívio social do indivíduo e aqueles que fazem parte da rotina dele.
É frequente ver as pessoas utilizando o celular para checar as notificações nas redes sociais a todo instante, por exemplo. Algumas vezes, esse uso constante sem moderação pode gerar o vício, mas, principalmente, faz uma mídia social, como o Facebook, selecionar aquilo que o indivíduo gostaria de ver com base em curtidas e comentários em postagens diversas.
Para quem não conhece muito sobre tecnologia, fica difícil entender como o filtro bolha, como é chamado o fenômeno, atua na vida de cada pessoa, mas é bem mais simples com alguns exemplos. O filtro bolha é como um mecanismo que exclui das suas redes sociais aquelas pessoas que o indivíduo não interage tanto nos posts. Os personagens abaixo vão ajudar a explicar um pouco melhor como o filtro bolha atua nas redes sociais.
Os perfis apresentados acima são de dois personagens fictícios e com personalidades diferentes. Enquanto Steve Rogers vem do Brooklyn, Tony Stark, por outro lado, não mostra de onde vem, mas as características fornecidas mostram que ele é um gênio bilionário. Isso significa que é a partir do perfil de cada usuário das redes sociais que um site de buscas, por exemplo, encontra artigos, matérias ou outros documentos que combinem com o perfil de cada um e com o assunto procurado.
O exemplo utilizado acima explica que, de acordo com o perfil de Steve, um capitão que saiu do Brooklyn e não tem tanto dinheiro, a ferramenta de buscas encontrou sites em que ele pode encontrar promoções de passagens e hotéis para Dubai, sem mencionar notícias sobre política ou outro assunto, dando a entender que ele não tem conhecimento suficiente para esse tipo de matéria. O que não ocorre com o perfil de Tony Stark, em que os primeiros resultados encontrados são as notícias sobre a princesa de Dubai desaparecida.
Eli Pariser, autor do livro “O Filtro Invisível”, exemplifica numa palestra do TED, que, um dia, os posts de amigos republicanos (partido político norte-americano mais alinhado com políticas conservadoras) que tinha no Facebook sumiram e apenas os posts dos amigos democratas (partido político norte-americano mais alinhado com políticas progressistas) apareciam no feed de notícias (página inicial de cada rede social). Isso acontece porque, graças à mudança de algoritmo da rede social, Eli curtia mais postagens sobre os democratas, o que levou o mecanismo a entender que ele era um democrata também e se interessava sobre esse assunto.
O filtro bolha leva o mecanismo a entender que as postagens mais lidas e curtidas pelo usuário são os temas que ele quer ver cada vez mais nas páginas principais de notícias. Então, o mecanismo retira as postagens que podem ser indesejadas pelo indivíduo. De acordo com o professor de Jornalismo Felipe Tessarolo, o filtro bolha não é positivo para o Jornalismo, pois pode-se criar uma sociedade de uma pessoa só. “Essa questão da bolha pode isolar o indivíduo de assuntos que ele não gosta, mas que deveria saber para compreender o que tem acontecido no mundo”, afirma.
Por outro lado, o professor explica que, para a Publicidade, o filtro bolha é ótimo, pois cada publicação consegue falar diretamente com a parte da sociedade que se interessa naquele assunto. “Se eu vejo pessoas que praticam esportes, consigo anunciar produtos diretamente para aqueles que buscam e comentam aquele assunto”, exemplifica.
Há dois anos e meio diante de uma empresa voltada para o marketing e a publicidade digital, atendendo diferentes clientes, Acácio Leal atua diariamente no mercado e consegue perceber a diferença entre como era antes e depois da mudança de algoritmos nas redes sociais. “Muitas vezes, a gente sente que a bolha está inserida no cliente. É difícil convencê-lo de que ele tem que tentar olhar de fora daquilo e que existe um mundo maior além da própria página de notícia dele”, comenta.
Acácio diz que a mudança de algoritmos nas redes sociais, facilitando a atuação do filtro bolha, foi sentida por todos os usuários. As páginas que ele e o sócio gerenciam na empresa deles, a Macromídia Digital, sofreram perda entre 20% a 30% de alcance nas postagens orgânicas, como são chamadas as postagens não patrocinadas. “Acredito que a restrição do alcance das páginas é uma medida de sobrevivência do Facebook, pois alguns dizem que ele só faz isso para que as empresas sejam obrigadas a pagar as postagens e lucrarem mais”, esclarece.
Além do Facebook, mídias sociais, como o Instagram, também aderiram à mudança do algoritmo e têm cada vez mais mostrado apenas postagens de pessoas que os usuários mais curtem. O Twitter, por outro lado, mostra alguns tweets mais curtidos e comentados, identificando o que o indivíduo pode ter perdido no tempo em que não estava online na rede social. O filtro bolha tem atuado cada vez mais em mídias sociais como essas, que são cada vez mais utilizadas no cotidiano do indivíduo.
Mas se engana quem acha que são apenas essas empresas sociais que utilizam o algoritmo e monitoram a vida dos usuários. Hoje em dia, grande parte dos celulares possuem o sistema operacional do Google, que vê o que você digita, busca e curte no seu celular, oferecendo notícias que envolvam os assuntos que você interage. O Google também acompanha os lugares que o usuário frequenta, indicando locais parecidos.
Por outro lado, o Spotify é o serviço de streaming de música, podcast e vídeo mais popular e mais usado no mundo inteiro. De uns anos pra cá, o serviço criou o chamado Daily Mix. Em uma definição mais completa, o Daily Mix é formado a partir do estilo de música que o usuário costuma ouvir. Então, os mixes são cheios de artistas que a pessoa já escuta frequentemente, mas com novas faixas similares às que o usuário ouve. À medida em que os gostos do usuário mudam, os Daily Mixes também mudam.
As Descobertas da Semana, também criação do Spotify, são playlists que apresentam faixas novas dos artistas que o usuário costuma ouvir e seguir no streaming. É um serviço do aplicativo que utiliza o algoritmo para cruzar as informações do que a pessoa faz no Spotify, mas não utiliza tanto o algoritmo quanto o Daily Mix.