Karol Costa
Fevereiro de 2020. João Marcos, após uma mudança repentina de cidade, se vê iniciando mais uma batalha em seus apenas 14 anos de idade. Adolescência… sentimentos à flor da pele. O medo, a ansiedade e a insegurança falavam mais alto. Surdo desde o nascimento, João e a família enfrentaram grandes desafios à procura de educação acessível nas escolas da região metropolitana. O que eles não imaginavam é que, agora, morando no interior, as coisas iriam piorar.
Cidade pequena, apenas uma escola no município e pouquíssimos professores graduados. A saga para encontrar um educador fluente em Libras começa, porém, uma força maior interrompe os planos da família: a pandemia da Covid-19.
Março de 2020. Um vírus letal se espalha pelo Brasil mudando drasticamente a realidade. O país para. Escolas fecham, dando início ao famoso ensino remoto: aulas à distância, professores sem estrutura, pais perdidos e alunos carentes de educação. João Marcos, que ainda não havia encontrado um educador para auxiliá-lo, mais uma vez se depara em uma árdua situação.
Matriculado na escola regular, o estudante inicia as aulas online sem muitos recursos, um pequeno smartphone é seu companheiro enquanto a família busca alguém para salvá-los daquele cenário de completo abandono do poder público. Meses se passam e nenhuma providência é tomada. A escola não tem verba para contratar um professor de Libras, muito menos para fornecer um computador para o aluno. O prefeito ignora a situação afirmando que a pandemia é um caso mais urgente, o que não deixa de ser verdade, porém a urgência da pandemia não significa que a educação precise ser renegada. Negligência completa.

A família não descansa. Dias e mais dias de longas caminhadas à prefeitura e à escola marcaram os meses seguintes. Diversas reuniões com coordenadores, vereadores e população se desenrolaram. Todos queriam que aquele tormento acabasse, principalmente João, que tentava se adaptar, mas não era o suficiente. Ele não se sentia suficiente. Sem um intérprete de Libras, o rendimento do adolescente, tal qual sua autoestima despencaram. A auto sabotagem começava ali.
Os amigos da família, cansados da aterradora situação e das diversas lutas por eles travadas, iniciaram uma campanha nas redes sociais para ajudar o menino. De petição a hashtag: “Educação para João”. A história do adolescente surdo que não conseguia estudar por descaso público viralizou na internet, pessoas espalhadas pelo mundo se compadeceram com a situação. João mal conseguia acreditar no que aquilo tudo havia se tornado. Chorava, às vezes de tristeza, às vezes de alegria e às vezes nem mesmo ele sabia o porquê de estar chorando.
A mobilização ganhou força ainda mais força, incomodando autoridades que não se importavam em tornar a educação acessível a todos, principalmente o prefeito que após estar nos holofotes, negou até a morte sua fala infeliz. Entretanto, o burburinho causado não apenas perturbou poderes, como sensibilizou educadores de toda a nação. Voluntários de todas as idades, cores e gêneros. Em meio a descrença, um ponto de esperança surgiu no coração da família que há quase um ano lutava pelo básico na educação.
Em poucos dias, diversos contatos foram realizados. O adolescente ganhara o tão sonhado computador de um senhorzinho de Recife, que encontrou em João, a figura do neto que já havia falecido. Um professor do Amazonas, que também era surdo, se prontificou a dar aulas para o menino, até que a prefeitura da cidadezinha disponibilizasse os recursos necessários para a contratação de um educador fluente em Libras. Até mesmo uma operadora de telefonia presenteou o garoto com internet gratuita até o ensino remoto acabar. A família não sabia a quem agradecer tamanhas bênçãos. João, pela primeira vez, sentiu-se parte da sociedade que frequentemente abandona e discrimina cidadãos deficientes.
Edição: Karol Costa
Imagem Destaque: Freepik